MONTE REAL - PADROEIRO: SÃO JOÃO BAPTISTA
Mergulha na noite dos tempos a origem de Monte Real. Desde os tempos pré-históricos sempre despertou a maior cobiça, tanto pela riqueza do seu solo como pela sua situação privilegiada, assenta no alto duma colina.
Fundada no Reguengo de Ulmar veio a chamar-se Póbra de Mô Real e Vila da Póvoa de Mon Real. Dos tempos em que tinha este último nome e a sua importância era grande, ainda restam, na parte mais alta da povoação, vestígios do antigo Paço Real, reduzido a uma construção restaurada, onde D. Dinis e a Rainha Santa Isabel terão habitado.
D. Dinis, em 1291, ordenou que se fizesse “abertas” no Paúl de Ulmar, a fim de que recebessem terras para lavrar durante dez anos os que estivessem dispostos ao seu cultivo, mediante o pagamento à coroa de um quarto de “todo o fruto que Deos hi der”.
Eram os esforços que o poder real fazia para fixar os colonos às terras, oferecendo-lhes condições atraentes para que se estabelecessem. Mas antes que isto fosse possível, tornou-se necessário fazer uma obra colossal.
Em Maio de 1291, o rei anúnciou o início daquela que foi uma das mais formidáveis obras de engenharia hidráulica do seu tempo. À custa do tesouro régio, encarrega os monges agrónomos de Alcobaça de mandar abrir, valar e enxugar os pântanos que se estendiam ao longo do Lis formando o imenso e estéril Paúl de Ulmar. Foram cerca de 2.000 hectares de terras improdutivas que se converteram em férteis campos de cultura.
Estabelecidos os colonos, D. Dinis em 1310 concedeu foral ao reguengo de “Camaria” que corresponde à região que medeia entre o mar e o monte que fica a cerca de um quilómetro a montante dos Paços de Monte Real. Antes, em 1292, já tinha outorgado foral à sua “Póbra” elevando-a à categoria de vila, com muitos privilégios, liberdades, foros e jurisdição independente da de Leiria.
Em 1463, D. Afonso V vendeu a D. Pedro de Meneses os direitos sobre o campo de Ulmar, permitindo-lhe pôr almoxarife, escrivães, oficiais e juíz, o que rendeu aos cofres reais uma avultada verba.
D. Manuel I, no foral que concedeu a Leiria em 1510, em vez de reparar esta situação, ainda mais a agravou, onerando os reguengueiros de Ulmar com tributos pesadíssimos. Seria por esta altura, 1512, que Monte Real se ia desanexar da freguesia de S. Tiago do Arrabalde de Leiria para juntamente com Carvide e Vieira formar uma nova, criada pelo bispo da Guarda, D. Pedro, prior-mor de Santa Cruz de Coimbra.
Mas Monte Real perderia em 1632, o lugar de Carvide e Vieira para a constituição da nova erecta de Carvide para em 1740 ser aquele segundo lugar elevado a freguesia.
Com a Restauração de 1640, à família Vila Real seriam confiscados todos os seus bens em benefício da coroa. Para além disso, devido aos serviços prestados aos Filipes, o Marquês e seu filho foram degolados. Monte Real, passados dois séculos, regressa ao domínio régio, o que se alteraria 12 anos depois ao ser incluida nos bens da recém-criada casa do Infantado.
Em meados do século XVIII, o donatário da vila era o Infante D. Pedro. Nessa época a freguesia era habitada por 693 pessoas residentes em 239 habitações, dedicando-se à agricultura e à indústria. A população continuava a crescer, o desenvolvimento era grande e nas vésperas das invasões francesas, o número de habitantes era de 894. Após as mesmas restavam 330 moradores.
CARVIDE - PADROEIRO: SÃO LOURENÇO
Carvide é uma terra antiquíssima, havendo notícias de que no início do século XIII já existia uma capela consagrada a S. Lourenço, orago da freguesia. A povoação esteve integrada até 1512 na freguesia de S. Tiago do Arrabalde de Leiria, passando, em seguida, a fazer parte de Monte Real, o que se verificou até 1632, altura em que Carvide passou a ser sede de uma nova freguesia.
No ano de 1632 a Freguesia de Monte Real foi dividida em duas, uma das quais é hoje a Freguesia de Carvide cujo Padroeiro é S. Lourenço, por haver desde 1592 uma ermida da invocação ao mesmo Santo.
A população ficou de pagar ao cura um alqueire de trigo cada um, os viúvos e viúvas meio alqueire como prestar toda a ajuda nas casas do cura, na Igreja, capela e sacristia. O seu território é banhado pelo rio Lis, que sempre teve grande influência no desenvolvimento económico e social da freguesia, de tal modo que, para além do mais, os terrenos ribeirinhos foram outrora o maior celeiro de milho do concelho de Leiria.
Na freguesia existem dois templos que permitem ao povo a realização dos seus actos de culto, como sejam a igreja paroquial, erigida em 1897 e a Capela dos Moinhos. Esta, é de construção antiga, sabendo-se já da sua existência em 1810, tendo sido objecto de remodelação durante o século XX.
Registos paroquiais indicam que antes das invasões francesas,em Outubro de 1810, a população desta freguesia era de 1.010, sendo 539 depois da retirada das tropas francesas, em Junho de 1812.
Segundo as lendas que, em criança, varias vezes ouvimos contar a familiares idosos já desaparecidos do tablado da vida, quando as famílias se reuniam, ao serão, por ocasião das matanças dos porcos, em alegres e inesquecíveis confraternizações à beira das lareiras, havia, algures, nos primórdios da fundação do lugar de Carvide, uma estrada muito antiga que servia de ligação entre os lugarejos da serra e a beira-mar, por onde os povos passavam a pé, a cavalo e com as carruagens daqueles tempos.
Por esses tempos, os usuários maus assíduos de tal estrada que, segundo consta, como todas as estradas medievais, nuns sítios tinha pavimento de pedaços de lage, noutros era só de terra batida, sendo nela muito frequente os assaltos por salteadores profissionais nos sítios ermos, eram os vendedores ambulantes, então mais conhecidos pelo nome genérico de «almocreves». Estes antigos mercadores, no dorso de cavalos, éguas e mulas, faziam transportar odres de azeite, mel silvestre, passas de figo e varias gama de outros produtos serranos, que vinham vender ou simplesmente trocar as povoações do Campo de Ulmar, por cereais, atingindo, por fim, a Póvoa marítima da Vieira, levando, no seu regresso, às terras do interior, sal, pescarias secas e outros géneros comestíveis colhidos, por compra ou simples troca, nas imediações do litoral.
Segundo a tradição, ao que parece, perto do lugar onde actualmente se situa a povoação de Carvide, havia umas «alminhas», à semelhança das que, acomodadas em nichos, ainda hoje existem espalhadas por esse país fora, à beira das estradas e dos caminhos (). Tal oratório público tinha, junto a ele, uma enorme videira que prodigalizava óptima sombra aos viandantes, e a que o povo local dedicava especial devoção e carinho, estando a mesma tal como o oratório, entregue aos cuidados de um morador vizinho. Em resumo, o citado oratório era conhecido nas redondezas da época, pelo nome de «Ara de Vide», de que, por aglutinação, resultou, para a povoação que lhe estava próxima, a primitiva designação toponímia de «ARAVIDE».
Nas andanças da mercancia desses almocreves que, nesses tempos remotos, deambulavam por estas paragens, um deles houve que teve a pouca sorte de ser chamado perante a Justiça local, a rogo do povo desta terra. A questão, ao fim e ao cabo, entre as partes em litígio, resumia-se a bem pouco. O almocreve, certamente com a cabeça toldada pelos vapores de algum vinho a mais, descuidou-se com o animal que trazia à sua guarda e que utilizava no transporte das suas mercadorias.
Este, talvez acossado pela fome e aproveitando-se do descuido do dono, foi-se à ramagem da videira, plantada junto do oratório e roeu-lhe todas as braças e folhagem, destruindo-a por completo.
Entrementes, o vigilante do oratório, alertou o povo desta ocorrência que, de imediato, logo ali exigiu ao almocreve a reparação dos danos sofridos, mediante pagamento de justa indemnização.
O almocreve, possivelmente, desculpou-se conforme pode, mas o certo é que, pelos meios suasórios, não foi possível a conciliação com o povo do lugar, nem arrumar a questão extrajudicialmente.
O pleito sobe, então, ao juiz da terra, já que a conciliação entre os contendores se mostrou frustrada. Gorada a conciliação, depois de discutida a causa, a sentença veio a ser de todo desfavorável ao pobre almocreve que acabou, a final, em seu entender, por ser condenado ao pagamento de pesada indemnização, pelos prejuízos causados pelo seu animal.
Assim, ficou célebre o desabafo do réu, que depois de ouvir pronunciar a sentença da boca do juiz, esta sem apelo nem agravo, exclamou: -«Cara a vide».
Daqui, novamente por aglutinação, veio a prevalecer o topónimo de «CARVIDE», que chegou, intacto, aos nossos dias.
Estas as lendas que conhecemos sobre a origem do topónimo actual da nossa terra… sem excluirmos a hipótese de, porventura, haver outras, mas a história, de certeza, essa sim, é capaz de ter sido outra bem diferente…